A EDP tem planeada uma barragem para o Vale do Tua que vai submergir uma parte da linha ferroviária do Tua (afluente do Douro), deixando várias povoações sem acesso por comboio, mas ao mesmo tempo vai produzir energia hidroeléctrica para vários concelhos. Além do bloqueio do comboio, vão ser afectados terrenos numa zona que pertence ao Douro Vinhateiro (atenção às garrafas com rótulo V.Q.P.R.D. - Vinho de Qualidade Produzido em Regidão Demarcada, sigla parodiada pelos locais como Vinho Que Pode Render a Deus, de tão bom que ele é;). Além de servir o dia-a-dia das populações, a linha do Tua, que reabriu este mês [
notícia], ajuda ao desenvolvimento turístico da região. Mas não por muito tempo...
mais info: [
Movimento Cívico pela Linha do Tua]
Ao mesmo tempo, a muitos quilómetros de distância e com o mesmo problema...
Assistimos recentemente aos protestos de vários tribos indígenas da região amazónica contra a construção de barragens nos afluentes do rio Amazonas. Algumas pequenas barragens já têm vindo a ser construídas, mas agora a obra em questão é a megabarragem de Belmonte que vai bloquear o rio Xingu, na zona de Altamira [quadrado vermelho na img, fonte: Projecto Pinkaiti]. Esta barragem vai ser gerida pela empresa ElectroBrás e que vai gerar em média 4 760 megawatts de energia por ano, o suficiente para abastecer cerca de 1 320 000 pessoas (apenas um pouco mais do que os habitantes de Lisboa). A energia não é para uso local: vai ser canalizada para povoações a Norte, Nordeste e Sudeste da zona [fonte: Agência Brasil]. Claro que energia hidroelétrica é melhor do a gerada por combustíveis fósseis, biodiesel, do que a termoelétrica ou a nuclear. Mas as pessoas das cidades abastecidas não têm ideia que para terem luz quando carregam no interruptor, o modo de vida tradicional e centenário de muitas populações vai ser devastado.
E por devastado quer dizer-se INUNDADO. Enquanto que os citadinos podem adaptar-se e procurar um emprego menos qualificado ou menos bem pago mas que lhes permite continuar a pagar a factura da electricidade, os indígenas que vão perder as terras herdadas dos seus antepassados não têm outro modo viver do que a agricultura de subsistência e a caça. Também não têm outro sítio onde viver. E mesmo que lhes dessem uma casinha na cidade, com electricidade e tudo, não têm formação e podem nem já ter capacidade de entrar no paradigma ocidental de estilo de vida, adaptar-se e arranjar um emprego que lhes permita sobreviver.
Posto isto, o que é melhor? Energia "limpa" e mais barata, mas à custa de um estrago irrecuperável nas sociedades indefesas e na biodiversidade que existe à distância de mil quilómetros de esquecimento? Da electricidade produzida em Altamira, quanta vai ser gasta em montras, em escritórios que ficam com as lâmpadas acesas toda a noite, em luzes de standby e em letreiros comerciais? Há uma maneira de equilibrar os danos e os ganhos? Políticas de racionamento de electricidade, preços altos para controlar o consumo? Porque é que a população num local há-de ter o seu modo de vida alterado e nem beneficiar do resultado dessas alterações? Por outro lado, porque é que uma população em desenvolvimento não poderá ter acesso a energia não poluente proveniente do seu próprio país? Aplica-se a lei do "quem chegou primeiro"? E se fosse cá em Portugal?
Pensem nisto...
mais info:
[Encontro Altamira]
[Amazônia.org especial Xingu]
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