Quem chama é quem é. Mai nada.

Há anos que assisto à batalha entre o pessoal das ciências sociais e humanas. A primeira vez que dei por ela foi no 12º ano, quando estava a frequentar o então chamado Agrupamento de Ciêntífico-Natural e a minha turma em bloco resolveu que Filosofia era uma disciplina para passar com 10, e Psicologia até se aproveitava mas apenas porque se aprendia o mapa fisiológico do cérebro.

Com o tempo a coisa foi piorando. Não há maior concentração de ateus raivosos, psiquiátrico-fóbicos e orgulhosos seguidores do síndroma de quem foi massacrado com religião quando era novo e ainda não o ultrapassou perdão, pensamento de Dawkings do que nas turmas dos cursos de ciências naturais e exactas em todas as universidades. (Auto-intitulam-se humanistas e espalham cartazes fotocopiados à borla na associação de estudantes a marcar reuniões para dizer mal de tudo o que não seja passível de ser escrito por uma fórmula matemática)

Bom, hoje em dia a separação que existe entre ciências naturais/exactas e ciências humanas é o equivalente ao fosso de crocodilos que rodeia os castelos encantados: os habitantes de cada um dos lados temem-se e odeiam-se mutuamente, quem tentar estar no meio é comido vivo.

E infelizmente, assim não vamos a lado nenhum. Porque quem se mete na ciência e no ambiente, fá-lo pura e simplesmente pela satisfação pessoal que lhe dá conhecer os mistérios de como funciona o Universo e sentir-se muito importante por isso, razões que são do mais humano que há. E quem segue pelas humanidades fá-lo porque quer compreender a fundo o que é isto de ser humano* e depois gaba-se de saber ler os outros como se fossem um livro aberto . De ambos os lados tenho encontrado pessoas que acham que têm a chave para decifrar o sentido da vida e resolver todos os problemas da humanidade, e que os "outros" são uma cambada de cegos que acham que o mundo se resume com o que aprenderam nos livros**.

É difícil explicar, e é preciso paciência, empatia e uma grande capacidade de simplificação, é preciso inventar palavras e às vezes fazer um desenho, mas é fundamental que as duas partes se consigam entender.

É que a ciência não tem utilidade nenhuma que não seja a de tornar a vida mais fácil ao ser humano. Não é anti-natural nem é má, é simplesmente a maneira que temos de nos expressar enquanto espécie. Há castores que constroem diques, há algas que transformam atmosferas de planetas inteiros - o Homo sapiens sapiens criou a civilização. E convém que a ponha a trabalhar a seu favor, senão sujeita-se às mesmas leis naturais que todos os outros: extingue-se.

A meu ver, se não houver integração das ciências naturais com as humanas, andamos a gastar dinheiro e tempo para nada. É muito giro produzir ratos fluorescentes e milho transgénico que cresce 3 vezes mais rápido, mas podiam-se ter gasto os recursos dessa investigação a descobrir porque é há entraves políticos que fazem com que excedentes de produção não sejam canalizados para os países com solos pobres que nunca vão poder auto-sustentar-se. E ao contrário também vale: é super interessante saber como se desenrascam os descendentes dos exilados da Alemanha nazi, mas neste momento há exilados a precisar de ajuda urgente para se integrarem e sobreviverem, e não vão alimentar-se de teses de 400 páginas.

Cada vez que vejo esta guerra entre cátedras, lembro-me de uma entrevista que a Clara Pinto Correia deu já lá vai mais de uma década, no programa A Ferro e Fogo, em que com duas frases resolveu o conflito desta gente toda: "Sim sou católica e isso não interfere com o ser cientista. Cada vez que olho através das lentes de um microscópio vejo coisas tão fantásticas que para mim são a prova que Deus existe".

A ciência não é uma vaca sagrada. Quanto mais conheço a Biologia, que é a minha área, mais sei que é impossível fazer generalizações em ciências exactas. A ciência é uma ferramenta como qualquer outra, e só precisamos dela se for para nos fazer sentir melhor. Sem objectivo, torna-se tão inútil como um par de barbatanas num gato.



*Que já diz o meu paizinho viver até uma planta vive, mas saber viver não é para qualquer um.

** Era juntá-los todos num quarto e dar-lhes um taco de basebol, não era;)?

5 comentários:

Manuel Rocha disse...

2Definitivamente, agradas-me pequena !!!"


:)))

(

Rui leprechaun disse...

Ena! bonito texto, eu cá por mim também gostei! :)

E como até caí aqui por mero acaso, acho que vou continuar a ler o mais que há p'ra ver!

Anónimo disse...

Olá Ritinha!

Conflitos à parte, será que tu conheces uma bola que se põe na máquina de lavar roupa e que dispensa a utilização de detergente? Se sim, qual a tua opinião sobre isso? Desculpa a questão, mas como perdi o teu email... Sabes, é que sugeriram-me essa bola, porque dizem que é boa para o ambiente uma vez que é desnecessário a utilização de detergente. Será que é eficaz, ou é tudo uma treta! ;)
Lembrei-me de ti, pois como defensora do ambiente e andando sempre em cima dos acontecimentos, quem sabe tens alguma opinião sobre isso. A bola tem o nome de OKO-BALL de lavar.
o meu email é: lotus8@sapo.pt
Assim que puderes diz-me alguma coisa por favor.

jinhos

Anónimo disse...

Onde é que já ouvi a parte do taco de basebol????
Belo texto...sim sra...

uf! disse...

Já lhe disse que gosto muito de a ler - e da pessoa que se vislumbra por detrás do que escreve?
E sim, esteve a escrever sobre «aquilo». É que a vida é mesmo isso, uma mistura permanente. Não há gavetas naturais; nós é que vamos fazendo umas, para lá arrumarmos melhor cada coisinha- e a encontrarmos mais depressa -, porque somos de vista curta e memória mínima . E depois esquecemo-nos que fomos nós que fizemos as gavetas e lá colocámos as coisinhas e pensamos que a vida é um grande armário com prateleiras e gavetas e muitas etiquetas e tudo catalogado - como algumas crianças pensam que os frangos são frutos que nascem nas prateleiras dos supermercados e que estão cobertos por uma pele a que se chama película aderente.
Um beijo, Rita